sexta-feira, 17 de junho de 2011

Aliança renovada


Desci do Cidade do Aço lá pelas nove da noite, com entrevista de emprego marcada pra  manhã do dia seguinte na  prefeitura, não tinha nada que ficar na rua procurando encrenca.
Mas em vez de ir direto pra casa da minha vó e dormir, resolvi dar uma passadinha não sei em que bar, rapidinho.

Estavam os dois irmãos Gabrig encostados no balcão, ambos gigantes com quase dois metros, já meio bêbados.  Era muito amigo do mais velho, o Eduardo, que sempre foi da paz e não era de beber muito. O mais novo, o Oscarzinho, era meio nervoso no copo e tinha o agravante de eu ter perturbado ele um pouco na infância. Dez anos atrás eu tinha namorado uma irmã deles. Na ocasião eu devia ter uns dezoito, ele uns dez. Uma vez cheguei até a dar uns cascudos nele pra defender a moça.

Os dois me viram de longe e me intimaram pra chegar. Senti o perigo, coisa que infelizmente sempre me atraiu. Fui chegando, dei boa noite e logo o assunto engrenou. Eu já estava na quarta velho barreiro, nem me lembrava mais de prefeitura nenhuma. Não me lembrava também que uma vez eu tinha soltado os passarinhos que o Oscarzinho tinha prendido em umas armadilhas. Eu liberava o passarinho e deixava um papelzinho escrito, “vale um pardal”.

Eu não me lembrava, mas ele eu acho que sim.

Uma certa hora lá, já sem medo de nada, resolvi contar uma piada com cinto de castidade e precisava de um chaveiro pra fazer a encenação. O Oscarzinho tinha um chaveirão lotado, mas falou que só emprestava se eu deixasse minha aliança com ele de garantia. A piada era boa, mas perdia a graça sem o chaveiro. Então tirei minha aliança e entreguei.

Ele me passou o chaveiro e comecei a piada, meio cabreiro porque ele não estava nem prestando atenção no que eu falava. Ficava só olhando pra aliança e acho que lembrando dos vale-passarinho que encontrava nas arapucas desarmadas.

No fim da piada ninguém riu. O Oscarzinho botou minha aliança na boca, tomou um golão de cerveja, bochechou e engoliu. -"Caramba, Oscarzinho, minha aliança? O que que eu falo em casa agora?" Ele me olhou firme : - "Fica frio. Hoje é dia de pagamento."  

Tentei pegar o caminho de casa, mas ele tirou meu sapato e disse que eu só iria quando ele deixasse. Aí me deu uma valentia na hora: -"Esse feladamãe é grande mas não é dois. Já bati uma vez, bato outra  e é agora!" Levantei e parti pra dentro. Ele me segurou com uma mão só e disse rindo que era pra eu sentar e contar outra piada, que ele tinha gostado da primeira, das chavinhas. E me tomou o chaveiro.

Sem muito o que fazer, o jeito foi ir me acalmando. Achei que o Eduardo fosse me dar um apoio, mas na hora o sangue deve ter falado mais alto.No fundo eu sabia que o Oscar era um bom sujeito, não ia me matar. E que a aliança era de ouro, mais cedo ou mais tarde brilharia na outra ponta. 

Não vou aqui contar as maldades que sofri a noite inteira, no fim conseguir fugir sem sapato pra casa, achando que ele não era tão bom sujeito assim, pelo menos quando bebia.

Uns dois dias depois a dona Margarida, mãe dos Gabrig, ligou brava pra casa da minha avó perguntando que diabos tinha acontecido que o Oscar estava todo dia virando uma caixinha com um pauzinho, que vinha um cheiro ruim dos infernos do quarto dele. A velhinha, calejada, fingia que ficava preocupada, desligava e voltava tranquila pro crochê dela.

Uns quatro dias depois alguém deixou a aliança lá na casa dela, dentro de um vidrinho com álcool.

O passeio pelo tubo digestivo do Oscar tinha deixado a aliança nova em folha, mais brilhosa do que no dia que eu tinha comprado na Joalheria Palácio. Na hora eu pensei até que tinha sido bom, mas depois vi a parte chata: ela nunca mais fez par com a aliança mais escurinha da Bia.

6 comentários:

  1. Título enganoso...Vem uma imagem bem mais romântica na cabeça.

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  2. Quer coisa mais romântica do que isso? A dedicação do Oscarzinho para devolver o objeto ao amigo é o supra sumo do romantismo.

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  3. Dpois me conta ql é a parte verdadeira da história, tá?

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  4. Lê, você acha que com quatro Velho Barreiro eu vou saber qual é a parte verdadeira?

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  5. Rita de Cassia Gabrig20 de agosto de 2011 às 01:45

    Claudio a historia e a cara do Oscarzinho, eu acredito sim, ele e doido.
    Ri muitoe parece que estava vendo a cena, voce escreve muito bem.Parabenspelo blog

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  6. Obrigado, Rita! Espero que o Oscarzinho leve na brincadeira. Tenho muito medo dele.

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